Sunday, June 29, 2008

Paraísos Perdidos.


''Estranho esse modo de ser que sustenta a felicidade na espera e na irrealização, o prazer, em não tê-lo alcançado''. Escrevi isso me despedindo de uma amiga. Era pra ela essa frase. No entanto pensei que não só ela vivia no paraíso perdido de Proust, existe muita gente que tem como filosofia essa premissa. São os que vivem na irrealidade, tem a fantasia como suporte. Não passam ao ato. Não ousam ir além dela. Não trazem pra si a crueza do que é vivido no real. Não querem as deformações. Rejeitam as marcas. Não suportam cicatrizes. Não sabem lidar com o que é vazio e sem beleza.
Portanto, desistem, preferem o peso do que jaz imanifesto. Do que gesta sem perspectivas de vir à luz. Dos abortos ignorados. Dos fetos deformados. Da vida que não fluiu. Do breu que não foi ofuscado.
Não escolher também é uma escolha. É um modo de ser. De estar. De viver. De morrer.
Viver e seus impasses inacabados.
Graças a Deus, nunca estamos prontos.
Graças a Deus, a vida é eterna.

óbvios.


Me peguei conversando com uma grande amiga no msn e disse : - Existe sempre um desamparo no que é óbvio. Calei. Senti. Fui além dessa frase pronta.
Será o amparo da certeza que nos conduz ? Ou o desamparo do que é óbvio é que nos encaminha?
E a incerteza, e o que é profundo ?
E o que está incólume? Se é que podemos estar nessa condição no mundo.
E tudo isso, onde fica, para onde vai. Como se faz, como se torna?
Estou numa profundidade onde as idéias, os sentimentos e os pensamentos não tem abrigo.
Talvez eu esteja sendo tão - somente óbvia na vida.
Nunca se sabe.

Estações.


Tempo de estações. De estacionar.
Tempo de perdição. De desencontro. De vácuos latentes.
Tempo de repetição. De erros óbvios, mas persistentes.
Tempo de olhar. Não se pode apenas ver. Luz demais cega.
Tempo de escutar. Não quero mais ouvir, escutar vai além.
Tempo de calar. Silêncio oculto. Silêncio gritante.
Tempo de desamor. De amor sem alma. Amor que não se adapta.
Tempo de desamparo. De reconhecer-se nas deficiências inscritas no próprio mundo.
Tempo que foi primavera. Com todas as flores.
Tempo que foi verão. Com todo o seu ardor.
Tempo que foi outono. Com seus frutos, mesmo alguns sendo imaturos demais. Caíram antes do tempo. Foram arrancados por mãos apressadas.
Tempo de inverno, com toda a elaboração lenta que isso implica.
Tempo de ser, simplesmente.
De existir no mundo.

Thursday, June 26, 2008

Deixo vc ir.


Despertei pensando nessa frase '' Mas o dia vem, e deixo você ir ...''
Até que ponto podemos deixar o outro ir?
Até que ponto partimos também, ou somos partidos?
Até que ponto o dia não se mostra como uma anestesia das partidas mais austeras?
No entanto, é preciso deixar, é preciso deixar-se. Mesmo que no fundo, nunca se consiga ir realmente.
Ficar, deixar, permitir, retornar. Palavras entoadas no mesmo destino. São laços, são vazios, são podas, são flores, quem sabe, com sorte, frutos.
Frutifiquei em meu vazio de dor.
Me fiz vazio que sustentou.
Me fiz desabrochar mesmo nunca tendo beleza.
A beleza passou. O ruído calou. A vida ruiu. O tempo curou.
Renasci do medo. Revivi a alegria de saber-se só.
Parti com a dureza de escolher ficar.
Fui,
Tornei,
Cresci,
Hoje somente sobrepujo o que já não sei de mim.

Saturday, June 21, 2008

Pontes.


Quero fazer a travessia.
Tenho medo do vagido do mundo que ouço todas as noites. Choro de infante, choro de criança, choro de bicho, de adulto, de velho. É choro.
É um pedido de ajuda. Vou ao encontro, volto inconsolável.
Mas é preciso ir. Não se pode refugar diante do movimento do mundo.
Viver é sábio. Viver é justo. Viver é triste. Viver é feliz. Viver é mergulhar.
Se não encontro, morro.
Morrer é profundo. Morrer é sagaz. Morrer, faz continuar.
Preciso da não proteção. Preciso não precisar . Precisar é frágil. Precisar é forte.
Amar é término. Amar é início. Amar é meio. Amar é fazer pontes.
É fazer amor.

Pessoas.


Minha vida está nas pessoas.
Nas pessoas que amei. Nas que não me permiti amar. Nas que não me amaram. Nas que quis amar mas não fui grande o suficiente. Nas que me rasgaram o coração. Nas que me reconheceram como um lar. Nas que me fizeram de abrigo. Nas que fui um abrigo. Nas que deixei morrer por falta de alimento. Nas que alimentei demais e as estraguei. Nas que abortei dentro de mim quando estavam quase vindo à luz. Nas que joguei luz demais e ceguei. Nas que sofreram o meu sofrer. Nas que sorriram o meu riso. Nas que ficaram quando deveriam partir. Nas que partiram quando deveriam ficar. Nas que refrigeraram quando poderiam aquecer. Nas que aqueceram quando o inverno parecia longo demais. Nas que morreram comigo, em todas as minhas mortes existenciais. Nas que renasceram comigo e me trouxeram de volta por diversas vezes. Nas pessoas ... está meu mundo.
Nas pessoas ... dentro de mim.

Hoje estava absorta pensando no que realmente fazia sentido pra mim, e me veio à mente ... somente pessoas que amo, que me fazem viva.

Friday, June 20, 2008

=)



Não ligue pra vida
Resto de amor ...
Não importa o mundo a se revelar.
Eu vou ampliar sua vinda em alto contraste com a volta ...
Close em preto e branco, com muito amor.
Quero ver você de perto, quero ver você de perto.

Hoje, despertei pensando no que seria presença,e no que faria dela, uma ausência. No que seria estar, no que seria partir.
Saí de mim para buscar a sutilidade e o limite desses conceitos, e voltei pra mim, sem respostas.
No entanto, embora sem resposta, não estava vazia.
Ressurgi preenchida com uma leveza que não me é peculiar. Voltei desarmada, pronta para o desamparo de não saber, de não compreender.
Jeito estranho de ser feliz, jeito estranho de ter vida.
Assim, passo; assim, parto; assim deserto.

Tuesday, June 17, 2008

Cuida-me, cuida-se.


Cuidar de uma criança é cuidar de sua mãe. Descobri isso hoje, quando me despedia de minha pequena paciente, e quem entrou em prantos, ao reverso da criança, foi sua mãe. Então pensei na fragilidade que subjaz na missão de ser mãe. Cuidar do indefeso em nós refletido no outro é sempre muito difícil. É uma travessia diante de nós, do que conhecemos e desconhecemos de nosso coração.
Hoje foi um dia pesado. Dia de desprender-se. Dia de deixar partir. Dia de desencontro.
E embora, viver nos traga sempre de volta, também nos faz partir por diversas vezes.
Gosto dessa dinâmica da vida que nunca nos deixa completamente sós. Que traz e leva as pessoas. Que as protege, que as aquece. Que as acalenta na dor.
Ser gente é sempre um processo de renascer ... nem da tristeza podemos desistir.
Continuar sempre ...
Viver sempre ...
para que um dia a morte nos assuma por inteiro.

Sunday, June 15, 2008

Assombros de dor.


Tenho me assombrado com a dor do mundo ultimamente. Quando pensamos que tudo está bem, irrompe uma cena que nos traz tanto sofrimento, sem paliativos, sem anestesia. O sofrimento muitas vezes nasce pra nós como a vida, como a tecitura de um projeto, como uma gestação. Ele vem em partes, nos desestruturando e rompendo ligaduras. Rompe, sutura, alicerça também, mas se faz preciso esperar o poder terapêutico do tempo, este que nos apela para paciência, para o amor, para a fé.
Tempo de dor ... para depois surgir o amor.
Tempo de ter tempo pra esperar.
Graças a Deus a vida é eterna ...

Dores da Vida.


A dinâmica da vida nunca pára. É interessante como a gente amanhece com as dores do dia anterior. Pequenas dores, grandes dores. Partidas inesperadas, mas urgentes quando existiu amor. Pessoas que precisam continuar somente dentro de nós porque nas estradas da vida não esbarraremos mais com elas. O destino mudou o plano de fundo ... e a maratona dos dias precisou seguir sem elas.
Mas o coração, esse grande sábio, pode mantê-las em nós, quando o tempo se tornar cruento demais, diante de tanta ausência.
Tantos dias seguintes, tantos vazios, tantas lágrimas contidas.
E embora a dor se aquiete, ela será sempre reconhecida, marcada, cravada no peito.
Peito que dorme, para suportar sentir ...
para suportar,
continuar.

Wednesday, June 11, 2008

A dor de uma criança.


A dor da fragilidade é sempre uma dor mais difícil de auscultar. No fundo, ela sempre traz de volta nossa criança interior, e quando isso irrompe, nos faz mais frágeis, mais sós, mais humanos.
Olhar para uma criança que chora, é voltar a ser sensível, é compreender que o sofrimento é implacável para todos. Ninguém está imune.
No entanto, olhar para uma criança que não chora às vezes faz a dor ser maior, porque queremos arrancar do seu peito um choro que talvez seja o nosso. O choro, as lágrimas, também precisam do seu tempo, elas têm seu próprio curso,a questão é saber esperar e acolhê-las quando se fizerem acessíveis, quando puderem vir à luz. Assim como gestamos um filho, um projeto, também gestamos uma dor que demora a se manifestar, isso não quer dizer que ela não esteja viva dentro de nós, mas que por alguma razão precisa ficar latente.
Não apressemos o percurso dela, não pensemos que ela seja menor.
Ela é simplesmente uma dor, a dor de uma criança.

Sunday, June 08, 2008

Gullivinho


Hoje, encontrei uma foto do meu filhotinho - Gulliver, no orkut de uma amiga. Naquele momento fui tomada por uma vontade imensa de colocá-la no meu álbum e dizer o quanto ele é especial em meu mundo.No entanto, eu queria colocá-lo sozinho, estava tentando recortar o meu rosto da foto, para que ele ficasse em destaque, somente ele, meu filhinho tão querido. Foi aí que algo me chamou atenção nesse instante, eu não pude recortar o meu rosto de perto dele, naquela foto éramos nós e ninguém poderia refutar essa imagem. Foi então que percebi o quanto Gulliver é indissociável de mim, o quanto faço parte dele, e o coração dele segue atado ao meu, sempre. Bastou uma imagem para que eu me desse conta, do amor que tinha, e às vezes não olhava muito, nem me dava conta. Assim, acontece na nossa vida, não olhamos as imagens como passagens da vida porque elas se tornam eternas, acontecendo o que for, a imagem fica, mesmo que a pessoa se vá. Todavia, ver além da imagem e olhar o que essa paisagem significa dentro de nós se faz caminho de amor ... e o melhor, trazemos o amor de volta, quando por vezes ele fica relegado ao abandono.
Amo meu filho ...amo o que ele se tornou diante de mim.

Saturday, June 07, 2008

Amor ou Admiração ?


Muitos procuram o amor pelo intermédio da admiração.Não consigo conceber o amor como uma esfera do admirar. Porque o admirar traz a frustração como companheira, sempre que surgir, e nesse sentido, as pessoas falam que deixaram de amar porque não admiram mais. Amor pobre, amor raso.O amor é justamente a frustração total com o outro em sentido profundo, você ama porque já foi além da admiração. Você já é maduro o suficiente para saber o outro falho, vazio, e mesmo assim continuar amando, acreditando, cuidando.
Admirar é um desamor, porque é um verbo limitado,pois exige do outro algo brilhante ou extraordinário para advir o amor.Admiro porque o outro tem uma força que não possuo ainda, admiro porque ele conseguiu ser o que ainda não sou, mas iludir-se pensando isso ser o amor é uma grande ilusão.
Admiração e amor seguem por mundos opostos pois o desencontro deles é previsível demais.
Amar sim, mas não por admiração, porque quem ama assim nao resiste ao que surge depois disso ...